quarta-feira, 8 de abril de 2009

Afeto na arte e arte da afetação

Acabou de ser lançado na Europa o 1º disco do cantor francês Sliimy, intitulado Paint Your Face. Sliimy ficou conhecido por ter regravado e divulgado pelo site YouTube, a exemplo de Lily Allen, a canção “Womanizer” de Britney Spears. Recentemente, fez seu coming out na televisão francesa e sua orientação sexual está nitidamente celebrada ao longo desse disco. Entretanto, mesmo que tudo isso não passe de uma hábil campanha de divulgação, há de se reconhecer que esse primeiro trabalho é muito agradável. Cumpre totalmente sua tarefa de ser um disco perfeito para alegrar a chegada da primavera européia ao misturar com certo êxito os ingredientes musicais e figurativos que fizeram o sucesso dos primeiros trabalhos de Mika e Lily Allen (definitivamente uma referência para Sliimy). Vejam o clipe bem divertido do primeiro single, ”Wake up”, no seguinte endereço: http://www.youtube.com/watch?v=pccguTaYDLQ&feature=related

Todavia, voltando às declarações de Sliimy que repercutiram positivamente para a divulgação do disco, há de se reconhecer que a arte da afetação sempre foi uma forma recorrente de expressão do afeto na arte. E se a evolução da moral e dos costumes, embora ainda imperfeita, permite e favorece a revelação da orientação sexual (mesmo que ainda reservada a certa “elite” sócio-econômico-cultural e ritualizada pelo coming out batismal), sempre houve uma absolvição subjacente do público para quem se vestisse de uma aura de afetação no intuito de representar sua arte e, consequentemente, transmitir suas emoções.

E se os reis europeus da Renascença e do Século das Luzes não hesitavam em enfeitar-se com joias, plumas, bordados, perucas, além de maquilagem, em uma ostentação de poder e riqueza teatralizada de forma pavonesca, alguns de nossos astros atuais, independentemente da expressão artística que escolheram, utilizam-se de símbolos semelhantes a fim de convidar a audiência a coroá-los e até sacralizá-los por meio de rituais pagãos, como é caso de Ney Matogrosso, Cauby Peixoto, John Galliano ou Freddie Mercury, entre outros.

Justamente porque a representação teatralizada dessa coroação funciona como um artefato que desnatura o próprio ato, ou seja, torna-o não natural e meramente representativo e simbólico, há uma aceitação ampla da afetação por parte do público, que vai além de todos os preconceitos sexuais e desarma qualquer ironia ou zombaria. Por outro lado, essa afetação, por ser ousada, funciona como uma rebeldia moral e sexual transgressiva com a qual o público se identifica de forma prazerosa.

Se seguirmos esse raciocínio como vetor, ao percorrermos as variantes da expressão da afetação dentro do ritual da representação artística, perceberemos que, por trás das diferentes formas de representação, existe uma analogia na finalidade do ato que é apenas a manifestação apurada do afeto por meio da arte.

E finalmente, ao se utilizar da afetação, o artista mostra seu afeto, despindo-se aos poucos, até ficar nu diante do público. E assim, ao mostrar sua própria nudez por meio da afetação, que em si é uma forma exacerbada da manifestação da emoção, ele acaba por magnificar sua própria emoção e conquistar o afeto do público em retribuição a esse ato de total entrega.

Para outras informações, recomendo os seguintes sites: http://www2.uol.com.br/neymatogrosso/; http://www.cauby.com.br/; http://www.mikasounds.com/; http://www.myspace.com/sliimy; http://www.johngalliano.com/

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